Páginas

domingo, 31 de agosto de 2014

Bertalha roxa: corante alimentar

Das bertalhas, a bertalha roxa é uma das mais bonitas (já falei dela, e das outras, aqui). Suas folhas são avermelhadas, o caule é roxo, os frutos são negros - ou seja, é cheia de pigmentos, dos pés à cabeça.

Minhas mudinhas estão bem pequenas, mas já frutificaram. Aproveitei para salvar as sementes, agora que estavam os frutos bem pretinhos. Não resisti e provei: frutinhos com gosto de beterraba. Pra ser mais específico, com gosto de talinhos de beterraba. O sabor não é muito interessante pra uma fruta in natura, nada doce, nem muito perfumada.

Quando me dei conta, minha mão estava rosa, assim como a pia, a toalha e minha blusa.... Não à toa, os pigmentos da bertalha foram estudados como possível corante alimentar, e após análise de sua estabilidade, a conclusão foi de que é um bom corante, resistente a variações de pH e ao calor. O artigo você pode encontrar aqui.

Água nutritiva: frutos esmagados 
Tarde demais: mão roxa.

Panqueca: Misturando os ingredientes
Massa misturada

Fruto esmagado com água solta tinta.

Pois bem, vale lembrar que os pigmentos encontrados na bertalha, mais concentrados no fruto, são do grupo das antocianinas, ótimos compostos anti-oxidantes que fazem bem pra nossa saúde.

Tentei uma receita de panqueca para ver se o pigmento era estável no calor, e o resultado foi bem interessante. Fiz uma panqueca pequenina, com uma colheradinha de massa. A cor ficou mais intensa na panqueca pronta, e o sabor era imperceptível.

Pequei 5 frutinhos, esmaguei com água. Misturei essa água com farinha, um tico de ovo e um fio de óleo. Perfumei com bauninha. Passada na geladeira com óleo. Panqueca rosa.Claro, poderia fazer macarrão rosa, arroz rosa, bolo rosa, suco rosa....

Pra você que não sabia o que fazer com os frutos da bertalha, fica aqui a minha sugestão: coma-os.

Bertalha: folha, frutos e mini-panqueca.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Pixirica: berry brasileira

Toda criança que come porcarias sabe associar o sabor azul ao de tutti-frutti. Chiclete azul, sorvete azul, jujuba azul. Claro, alguns fabricantes não respeitavam minha lógica infantil e faziam algumas jujubas tenebrosas sabor anis, mas acho que superei o trauma. 

Nunca entendi a lógica entre o azul e o tutti-frutti. Será que é porque todas as outras frutas possuem outras cores, menos azul? (Não vou nem ousar pensar como o sabor azul podia ser de anis, a não ser por uma brincadeira de muito mal gosto com a cor anil, anil anis). Pelo menos das frutas mais comuns, nenhuma azul, nem por fora, nem por dentro. No máximo a uva, bem roxa.

Nos anos 2000 apareceu um novo sabor azul para os paladares brasileiro. Claro, com o aumento do poder aquisitivo da classe média, que viajava mais e consumia as coisas "lá de fora", a importação de produtos estrangeiros e maior uso de internet, e seus consequentes blogs de culinária. Era a blueberry. Quem olhava com atenção as vitrines das confeitarias chiques sabe qual foi a vedete da década. Nem o morango -, eterno clássico, nem a ameixa - para a qual as crianças torcem a cara, nem as jabuticabas - muito caroçudas para decoração. Era ele, a blueberry, já traduzida sob o nome de mirtilo.

Esse mirtilo chegava embaladinho a preços megalomaníacos em caixinhas forradas com espuma, um anel numa caixinha de jóias. O gosto? Bem, o gosto.... Não compensava o preço. Pra um brasileiro acostumado à mangas cheirosas, bananas inebriantes, jacas perfumadíssimas, goiabas empestiantes, o mirtilo era bem sem graça.

Só fui aprender o segredo do mirtilo lá fora: ele não tem muito sabor cru, mas se transforma quando cozido. Libera aroma de especiarias, frutado, doce. Aí sim.

Mas e tudo isso pra lembrar que: existem frutas azuis no Brasil?

Berry brasileira: Pixirica, muito prazer
Existem. Vamos falar da nossa berry da Mata Atlântica, que nasce fácil em qualquer lugar. Os nomes não são muito encantadores, e duvido que ela passe a coroar ricos doces confeitados com eles. O primeiro nome popular é esquisito: Pixirica. O segundo nome mais comum, o horror: Meleca-de-cachorro.

Antes que você fique enjoado e vá embora, vou contar da Pixirica (vamos fingir que os outros nomes melequentos que dão a ela não existem, ok?). Ela é uma melastomatácea, comum na região centro-oeste, sul e sudeste, de nome científico Leandra australis. Tem folhas muito parecidas com a da Quaresmeira, mas porte pequeno e ramos avermelhados.

Muitas pixiricas, que eu disputo com os morcegos.

 Eu a vi pela primeira vez quando fui me enfiar na mata para fazer umas trilhas de cachoeira com meu amigo Ravi lá em Paranapiacaba. Nascia num solo lodoso branco, pastoso e encharcado, onde outras poucas espécies nasciam. Estavam cobertas de liquens, musgos e bromélias, devido à eterna neblina. Os frutinhos, comi sem saber o que eram. Não morri.

 Por isso a minha surpresa quando a vi nascendo em Itu, num solo argiloso, seco, ácido e a pleno sol, coberta de poeira vermelha. Nem tinha dado atenção, é comum nascerem manacás e quaresmeiras-bravas no meio do mato e do pomar, então ignorei. Um dia, por acaso, ouvi falar dessa frutinha com nome estranho, e a ficha caiu. Era ela!

Na sombra fica densa e produz pouco, no sol fica desgalhada e produz muito, muito. As frutas amadurecem de um dia para o outro e eu colhia meio copo de frutas todo dia, e ia congelando. Tem boa duração pós-colheita, não murcha nem embolora, apenas fica meio opaca por estar na geladeira. Frutas pilosas, cremosas, micro sementes quase invisíveis. 

Pura, é doce doce, sem nenhuma acidez, com gosto de açúcar. 

Sabe aquele sabor de açúcar refinado? Nem um sabor muito surpreendente, claro, mas me chamou a atenção o fato de ela ter a polpa azul - não conheço nenhuma fruta brasileira com polpa azul. E das blueberries que provei na vida também não achei nenhum sabor fora do comum. Então, acho que não há realmente nenhuma superioridade na estrangeira. Também não vi bicho, nem dentro nem fora da fruta. 

Por dentro, um dos azuis mais lindos que já vi. Na literatura, o que eu suspeitava: é uma bomba de antioxidantes, rica em antocianinas.

Pixiricas esmagadas nas mão: Meleca de Cachorro?
 O único problema é que a casca da fruta é grossa, como a de uma jabuticaba. Quebra tranquilamente nos dentes, mas para geléia a textura fica pedaçuda. Na segunda tentativa, processei as frutas inteiras e levei pra panela o purê. A geléia ficou escura, negra, e no pão fica avermelhada. O ideal foi fazer uma geléia com as frutas inteiras, amassar de leve com a colher de pau e passar pela peneira. O resultado foi um azul-celeste muito bonito. Só não me pergunte celeste de qual hora do dia...

Geléia azul. Quem faz pouco, come pouco.
 As mudinhas aparecem de vez em quando perto dos pés das frutas, provavelmente porque os morcegos pousados fizeram as necessidades ali. Salvei duas mudas em vasos já, elas perderam as folhas, mas as gemas ainda estão verdes. Esperar para ver.... A planta tem raiz profunda, difícil de cavar, e há reservas de alimento nas raízes (xilopódio, rizoma, caule modificado?)

Quem já viu por aí? Quem arrisca fazer um belo doce azul, com nossa berry brasileira?

Pixirica, amadurece de um dia pro outro.
Antes que você me pergunte, já conto. Existe outra pixirica, também da família das Melastomatáceas, comestível. É o fruto da Clidemia hirta. Só tive a chance de prová-lo uma vez. Essa sim é mais saboroso, com sabor mais pronunciado. Cresce em locais umidos e sombreados, ou seja, predomina aqui no sudeste na Mata Atlântica. Eu até poderia chamar a Leandra australis de Pixirica do Sol e a Clidemia hirta de Pixirica da Sombra. Mas não sei se posso. E não quero inventar moda.

Frutos da outra pixirica, Clidemia hirta. Foto daqui

Flores da Clidemia hirta, foto daqui.
Clidemia hirta: densa população, local sombreado.
Foto daqui.
GUIA DE IDENTIFICAÇÃO
Leandra australis, sin Leandra atropurpureaSubarbustos a arbustos, 0,5-3,0 m de altura. Ramos cobertos de pelos, ligeiramente avermelhados nos brotos, folhas igualmente peludinhas, ovalada, com cinco faixas de venação, de ponta aguda e margem denticulada.  Flores arrumadas em panículas, todas com 5 pétalas, com corola alva e estames amarelos. Fruto oval, de até 0,5cm, peludinhos, com muitas sementes minúsculas. Sabor doce. 

LOCAL DE OCORRÊNCIA
Planta heliófila, ou seja, nasce em pleno sol. Pioneira, ruderal, nasce em orlas de mata e beiras de estrada. Sudeste e Sul, principalmente. 

MODO DE PREPARAÇÃO
Frutos consumidos cozidos ou in natura.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Renovando o canteiro: a importância da palhada

Agosto chegou, setembro está próximo. Embora a expectativa de ter chuvas seja frustrante essas semanas, já dá para começar a preparar o canteiro - ou a horta pras plantas de calor. Na europa é muito difundida a técnica chamada mulch, que nada mais é do que nunca deixar a terra descoberta.

Folhas secas, serragem, aparas de grama, restos de carpinado, tudo vale. O que você quer é criar um microclima superficial na terra. Imagine assim: exposta ao sol, o calor seca a terra, a radiação mata os organismos, a terra seca rápido demais para permitir que sementes germinem, o solo fica compacto e seco. Daí vem a chuva, lava aquele solo endurecido, leva mineirais embora, leva mudinhas pequenas.... E nada para nesse local.

Com a camada morta, simulando o que acontece numa floresta, há abrigo pros bichos, sombra pras mudas, um verdadeiro guarda-sol e guarda-chuva pro solo. A água respinga com menos agressividade, e demora pra evaporar. Parece bom, não?

Aproveite a estação. As mostardas já podem ser colhidas, as couves, os repolhos e os brócolis de inverno. A horta vai ficando vazia, porque as brassicaceas estão começando a parar de crescer: logo vão dar flor. Aproveite a horta vazia para refazer a camada de mulch, ou cobertura morta. Se não tiver muitas folhas ou aparas de grama, pode conseguir numa madeireira um bocado de serragem - apenas tenha certeza que é de madeira sem tratamento, nada de compensados de madeira.

Flores: dálias nascendo num canteiro coberto
por serragem grossa.
Sempre bom lembrar que a terra cultiva a si própria. Se você a mantém coberta de matéria orgânica, bem cuidada, com plantas e palhada, ela já está pronta pra recomeçar. A única vez que deve-se revolver o solo é quando vamos começar uma horta. Especialmente se o solo estiver muito compacto, duro, seco, argiloso, descoberto. O sol foi endurecendo a argila, a água levou embora os nutrientes e fica difícil qualquer planta conseguir penetrar as raízes num solo assim. Melhor dar uma melhorada, não?

Assim, revolver o solo pode ser uma boa ideia se você está começando um canteiro agora, ou nunca colocou mulch no seu. Não precisa cavar muito profundo, afinal, você não quer fazer um massacre de minhocas. Uns 5 centímetros está bom. A adição de nutrientes deve ser sempre com base nas demandas do solo.

Solo: compacto, raízes superficiais, argiloso, raso
Preparando um novo canteiro com adubação e mulch

Aqui em casa, de solo argiloso compacto e rico em alumínio, a instrução foi adicionar calcáreo. Assim, fui revolvendo, adicionei uma quantidade pequena de calcáreo dolomítico e misturei na camada.

O calcáreo dolomítico é rico nos micronutrientes essenciais: cálcio, magnésio e enxofre. De quebra, levanta um pouco o pH do solo, reduz o aluminio disponível, o que é bom. Junto com ele, adiciono uma dose pequena de terra do galinheiro do vizinho mais esterco de vaca que pegamos no caminho. Ambos são ricos em microorganismos benéficos, e boas fontes de nitrogênio. Pode-se adicionar um pouco de cinzas de fogueira, ricas em fósforo e potássio, que ajudam a regular o pH do solo. Misture tudo muito bem, umedeça suavemente, cubra co folhas secas e deixe descansar alguns dias, para que o pH se estabilize.

Depois disso, pode-se adiciona um pouco de terra de floresta, folhas secas e terra de composteira. Pronto, dá-lhe humus e outros materiais para ajudar a aerar o solo, manter sua estrutura, trazer organismos benéficos. Já vai dando pra perceber que a terra fica mais estruturada, demora mais pra secar, retém mais água. Misture tudo muito bem, cubra com folhas secas e umedeça.


Meu canteiro sorguido: terra boa misturada com matéria
orgânica e coberta com palhada.
Pedras encontradas no terreno: pesadas!

Eu gosto pessoalmente de fazer canteiros soerguidos. Esse canteiro nada mais é que um canteiro plantado acima do nível do solo. Ele é geralmente feito para facilitar a colheita de plantas com raízes: batata, beterraba, rabanete, batatas doces, tupinambos, cebolas, alhos... Mas também é uma boa opção se sua área tem solo muito duro ou se o solo é muito pobre e seco, ou muito arenoso, ou muito argiloso. Assim, é feita uma camada de terra boa acima do solo, o que deve ser suficiente para cuidar de plantas de médio porte.

Aqui em casa tenho muitas pedras naturais do terreno à minha disposição. Resolvi fazer um canteiro em meia-lua integrado com o solo, de forma que ele não ficasse todo cercado e as plantas pudesse se alastrar. Puxei a terra pro local do canteiro, cerquei com as pedras, cobri com a terra de composteira. Como meu solo aqui é raso, as plantas de porte pequeno ganham uma vantagem extra na hora de penetrar no solo.

Paralelamente a isso, vá semeando suas mudinhas num vaso ou numa sementeira. Claro, as que toleram transplante. Os feijões em geral não gostam de ficar mudando de lugar. As demais verduras, especialmente as solanáceas (jiló, berinjela, fisalis, tomate), toleram muito bem.

Essas semanas até a primavera elas vão crescer na sementeira, e já podem ir para a horta. Veja o que temos feito.

As ervilhas podem ser plantadas direto na terra.
 Aproveite o frio, elas adoram! Ah, o verde são folhas
de uma palmeira podada, colocadas pra proteger a terra.

Pedras que sobraram da pavimentação da rua, um galho caído.
Em 3 semanas, uma horta formada!

Pedras em volta, verduras dentro: a palhada ajuda a
manter umidade, as regas são reduzidos.
 Nesse canteiro, adubação com chorume de composteira.

Na sua casa, no seu quintal, não importa seu tipo de solo, adubação orgânica é sempre bem vinda. Esterco, terra de composteira, humus de minhoca, casca de ovo, cinza de fogueira, terra de curral, chorume de composteira. Aposto que pelo menos uma dessa opções é acessível. Depois, cubra tudo com folhas secas, serragem, aparas de grama. As plantas vão que vão!


segunda-feira, 18 de agosto de 2014

A farsa da abundância: É tudo a mesma coisa

Das verduras amargas, quais você lembra o nome? A escarola é a mais famosa, virou sabor de pizza. Qual mais? Chicória, por causa daquele comercial da criancinha implicante (só eu que lembro disso?). Se você estiver numa feira, certamente vai encontrar ainda almeirão, pão-de-açúcar, catalonha...

Hum, se eu quiser uma salada bem vitaminada basta colocar um pouco de cada uma, certo? Talvez. Num prato com escarola, chicória, almeirão, pão-de-açúcar, catalonha, quantas espécies haverão ali? Apenas uma. Só uma?

Chicorium intybus, é seu nome científico. Calma, como assim, quer dizer que o feirante está me vendendo a mesma planta sob vários nomes? Está, sim. É tudo a mesma verdura. Uma mais comprida, uma mais lisa, uma mais amarga, colorações diferentes, formas diferentes.  Igual alface romana, alface crespa, lisa, americana, mimosa.... A única diferença é que todas chamam-se "alface". No caso das "Chicorium", por sua vez, elas recebem vários nomes.

No caso das plantas do gênero Chicorium, cada uma recebeu um nome, de certa forma enganando o consumidor. Não que os supermercados e feiras tenham agido de má fé, mas fato é: estão vendendo várias verões da mesma coisa. Tudo fruto de seleção, claro, obtendo várias variedades. Mas no final das contas, é tudo a mesma coisa. Nutricionalmente, então, não precisa ser um expert pra deduzir que elas tem um perfil parecido. Ou seja, mais do mesmo.

Mas e as outras verduras da horta? Ah, elas sim são de espécies diferentes. Formas diferentes, sabores diferentes, vitaminas e minerais diferentes. A maior parte das verdurinhas amargas é da família das Asteraceas, mas isso não quer dizer que toda asteracea é amarga. Por exemplo, a alface.

Desafio: quantas espécies tem na foto abaixo? Todas asteráceas, claro.

Dente de leão, almeirão, serralha, crepe do japão e serralhinha.

Sem pegadinhas, são cinco espécies. A primeira, o dente-de-leão (Taraxacum officinale), tem a folha mais recortada de todas. A segunda, mais lisa, é uma variedade ruderal de almeirão (Chicorium intybus). Depois, a serralha, (Sonchus oleraceus), a mais amarga de todas. Depois, o crepe do japão (Crepis japonica, já falamos dele aqui), saborosa e suave. Por fim, a emília, ou serralhinha (Emilia sonchifolia), de sabor forte e levemente amarga.

Viu só, você era rico e nem sabia. Elas estão nas ruas, praças, calçadas, hortas, vasos, calhas... Porque não tentar umas sementes e plantar na horta? Mais variedade, mais sabor, mais nutrientes. Quem disse que salada precisa ser monótona?

Se você não gosta de sabores amargos, mesmo assim vale tentar. A serralha e o dente de leão talvez possam ser traumáticos puros. E se misturados numa salada neutra, como alface? Ou numa combinação intensa, com rúcula e folhas de mostarda? E porque não adicionar um molho para deixar mais gostoso?

RECEITA

Molho simples para verduras amargas (para 4 pessoas).

1 col sopa de mel, melaço ou glucose
2 col sopa de suco de limão
2 col sopa azeite
1 pitada pimenta, a gosto
1 pitada de gengibre ralado
1 col café de qualquer uma delas: cebolinha, manjericão, tomilho, coentro
1 col café de mostarda, em pó ou em pasta
1/2 col café sal

Misture tudo com um garfo e sirva sobre a salada.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Vacas vegetarianas: pata de vaca na salada

A pata de vaca, ao contrário do que o nome possa indicar, não é uma planta nada mórbida. Na verdade, é tão graciosa que chega a ser uma das preferidas para arborização urbana. O porte é arbóreo,  as folhas são arredondadas, as raízes não quebram o concreto, tolera bem a seca, não suja muito a rua, as flores são muito vistosas - não à toa, está plantada por todo o Brasil. Na realidade, ela gosta de invernos secos e mais amenos, então vegeta melhor no sudeste e sul.

Bauhinia variegata: cheia de flores. E abelhas...

Existem 3 principais espécies de Pata de Vaca. A primeira, nativa, de nome científico Bauhinia forficata, tem folhas pontiagudas nas estremidades, flores claras com pétalas estreitas e floresce de outubro a janeiro. 
As outras duas são trazidas de fora, e são as que predominam na arborização urbana. As folhas são completamente arredondadas, flores vistosas de pétalas largas. A Bauhinia variegata tem flores brancas e floresce no final do inverno. Já a Bauhinia purpurea, de flores rosadas, floresce um pouco antes.

Bauhinia variegata, detalhe da flor.

O que se come? Bem, as sementes são parcialmente comestíveis, mas são amargas e é preciso saber prepará-las. As flores, essas sim, são completamente comestíveis, nas três espécies. Tem sabor delicado e perfumam suavemente a salada. O talo não deve ser consumido, já as pétalas, podem ser consumidas sem problemas.


IDENTIFICAÇÃO:
Árvore de médio ou pequeno porte, até 10m de altura, decídua na estação seca. Folhas de aprox 10cm de comprimento, arredondadas e fundidas em forma de fenda, igual a para de uma vaca. Flores conspícuas, brancas ou rosadas, de 8 a 12 cm, com cinco pétalas, sendo uma rajada e as demais lisas. As vagens chegam a até 30cm e possuem diversas sementes arredondadas e viáveis.

CONSUMO

Pétalas cruas, na salada ou no chá. Podem ornamentar doces, porém são muito delicadas.
 SUGESTÃO DE CONSUMO



Salada de alface, capuchinha, tomatinhos e pétalas de pata de vaca. Limão, azeite e sal.

domingo, 10 de agosto de 2014

Os Matos de Comer: Quelites - Parte 2

A horta de casa: de tudo um pouco. Com flores? Melhor ainda.

Dos contos infantis dos Irmãos Grimm, dentre eles Chapeuzinho Vermelho, existe um conto menos conhecido, chamado Rumpelstiltskin. Aqui no Brasil o conto é quase desconhecido. Trata-se da história de uma donzela que deve favores a um duende mágico, que transforma desejos em realidade, cobrando, contudo, um preço para isso. Seria um tipo de mercenário mágico em versão infantil.O duende, chamado Rumpelstiltskin, tem poderes sobre a tal donzela, que fica devendo-lhe um pedido, que foi realizado, mas ela não pagou-lhe nada em troca. Prometeu-lhe seu filho primogênito, mas quando a criança nasceu, o duende propôs um desafio: se ela descobrisse seu nome, a dívida estaria quitada. Pois bem, já contando o final do conto, a moça descobre o nome do duende mágico, dando a ela poder sobre ele, e pondo fim à dívida.

E é da moral desse conto que eu gosto: só temos poder sobre as coisas que conhecemos o nome. Voltando pros nossos matos de comer, é exatamente isso: só sei que um mato é comestível depois de descobrir o nome dele - e ter o poder de pesquisar sobre ele. E não precisa ser o nome todo-pomposo em latim, não: o nome popular já ajuda.


Falamos em uma postagem passada (que você pode conferir aqui) das plantas alimentícias não-convencionais, as PANC's. Explicamos a origem do termo, quais plantas se enquadram nas PANC's e quais suas características.

Agora, vamos falar das hortaliças não-convencionais, as HONC (essas siglas ficam cada vez mais engraçadas). Existe um termo mexicano para verdura chamado "quelite". Esse termo vem do idioma náhuatl, a palavra "quílitil", que foi modernizada no espanhol mexicano para o termo "quelite".

Originalmente, significava algo como "verduras comestíveis, tenras, macias" (em alguns casos, de plantas cultivadas). O interessante é que essa nomenclatura, que inclui uma enorme quantidade de plantas diferentes, é usada há séculos no México. Quelite no México não é só verdura do mercado e da feira, mas inclui as plantas espontâneas, algumas cultivadas até em escala comercial, mas que ficam fora do que nós conhecemos como verdura. Essas plantas, diferentemente das brasileiras, são amplamente citadas nas buscas em sites mexicanos, o que significa para mim, que elas são consumidas em maior escala que no Brasil. Exemplos? Veja aqui (em inglês) e aqui (em espanhol).

Ou seja, consome-se mais PANC'S no México porque o nome delas é conhecido? Talvez. Arrisco no meu palpite de que conhecimento é poder, e saber o nome de algo nos dá poder em saber o que é, para que serve e como se come. Aqui, uma planta que nasce no quintal é "matinho", afinal, quem sabe o nome do que nasce sozinho, semeado pela natureza. Lá, contudo, essa mesma planta é visto com outros olhos: é uma verdura com nome e história de consumo e preparo. Mais fácil assim, né?

Os nomes populares das PANC'S no Brasil são muitos, não digo o contrário. Lingua de vaca, carne de pobre, buva, picão preto, serralha, pincel de estudante, mastruço, bertalha, vinagreira. Mas elas são muito mais conhecidas nos rótulos de agrotóxicos do que nos livros de receita. A indústria química os conhece bem, mas os cozinheiros, não. Paradoxo?

Então, aproveitemos as nossas PANC'S! São as nossas plantas ruderais, de fundo de quintal, de fresta na calçada, de beira de estrada,  as plantas que não são nada exigentes e por essa razão, nascem em qualquer lugar. A maior parte delas, para nossa sorte, é das famílias Asteraceae, Amaranthaceae e Brassicaceae - famílias botânicas que, em geral, possuem espécies pouco venenosas, e portanto, comestíveis.

Minha proposta é: vamos pensar nos nosso matos de comer como quelites? É só um ajuste de terminologia, mas no final, tem um sentido mais prático. Não são matos, nem daninhas, nem capins, nem inços. São, no fim das contas, quelites, ou verduras. São comida, barata e de qualidade. Vamos saber o nome do que nasce na rua?

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Andu, Guandu - Muitos tipos

Cajanus cajam, eu adoro esse nome. É o nome científico do Guandú, também chamado de Andú. Tem rima, tem som, tem musicalidade. Quase um mantra! cajanuscajam cajanuscajan cajanuscajam oooommmm

Brincadeiras à parte, agora é época de colheita. Ela vai de junho a agosto, ou seja, inverno. As vagens estão pendendo nas ramas - algumas até meio tombadas, tamanho o peso.

O feijão guandú é uma planta famosa por seus diversos usos. Alimenta gentes, alimenta bichos, serve de adubo para outras plantas e melhora o solo. As sementes verdes são deliciosas, lembram ervilha fresca. São fáceis de tirar da vagem com ajuda de uma tesoura. Ficam excelentes no arroz, numa torta, num macarrão. As sementes secas devem ser obtidas das vagens já marrons, que devem ser penduradas e deixadas secar ao sol, evitando que peguem chuva e sereno. Depois, coloca-se dentro de um lençol e dá-lhe umas boas porradas. Se for feito num dia seco de inverno, com as vagens bem sequinhas, soltam-se facilmente. Daí, é começar a catança. Guarde todos num frasco aberto.

O legal do guandu é que ele é muito resistente a qualquer ambiente: gosta de calorão, vai bem no frio, gosta de umidade, vai bem na estiagem. Pode passar meses sem chuva que o guandu continua lá, firme e forte, com folhas verdes e suas florezinhas vermelhas e amarelas. 

Ele aguenta bem a seca porque suas raízes vão bem fundo, quebrando a terra dura até pegar a umidade lá das profundezas. Como vantagem, vai afofando o solo, e de quebra, deixando nitrogênio no caminho. Suas raízes são cheias de nódulos, onde vivem bactérias que ajudam a transformar o nitrogênio atmosférico e transformando-o  numa forma útil para a planta.Quando a planta morre, suas raízes se decompõem e deixam um túnel no lugar, ajudando a terra a absorver a água da chuva.

É suscetível a poucas doenças, mas pode sucumbir a infestação de ácaros e alguns fungos.

Além de tudo, pode servir de sombreamento para plantas, corta-vento, para restabelecer terras degradadas, para ocupar terrenos vazios...

Das sementes, conheço dois tipos: a lisa e a rajada. Em geral, as plantas de semente lisa tem flor amarela (subsp. flava) e as de semente rajada, flores vermelhas. Isso aqui no sudeste, em São Paulo, mas não é uma regra. Descobri que existem mais de 5.000 cultivares do guandu.

Para plantar, escolha um local a pleno sol. O solo não precisa ser fértil nem bem muito irrigado - mas claro, essas condições ajudam. Deixe o fejão hidratando 24h em água antes de plantar. Coloque na cova 3 feijões. Após o primeiro mês, remova as duas plantas mais fracas e deixe o maior - esse processo chama desbaste ou raleio. Ajuda a remover as plantas geneticamente mais fracas, para ter certeza que o seu guandú será forte e saudável.

Para cozinhar, deixe de molho de um dia para o outro, descarte a água, depois cozinhe como feijão normal. Ah, sim, ele pega mais gosto se for cozido na pressão junto com temperos: cebola, alho, louro, cominho, coentro...

Ah, uma dica de armazenagem. O gorgulhão do guandú é um besouro pequenininho que bota ovos no guandú verde. Quando o grão amadurece, parece perfeito por fora, mas dentro a larva está se alimentando do grão. Depois de um mês, a larva está gordinha, se transforma num besouro adulto. O problema: depois de um mês que você colheu e armazenou o feijão, o bichinho aparece e ataca os outros feijões. Para evitar isso, fique de olho no vidro onde o quando está guardado, de olho se não tem bicho. Outro segredo é consumir logo, antes que eles se proliferem. Claro que isso não é sempre que acontece, mas bom evitar, né?

E você, já comeu, como gosta de preparar, usa para quê?

Flor do feijão de semente lisa: amarelinha.

Feijão carregado de vagens: boa colheita


Guandú, do liso e do rajado

domingo, 3 de agosto de 2014

Mudas e Sementes, Parque da Luz

Aconteceu domingo, dia 03/08/2014, o 16º Pic Nic de Troca de Sementes e Mudas das Estações - Inverno, no Parque da Luz, São Paulo capital.

Chegando no Parque, a primeira coisa que chamou a atenção foi uma reunião de motoqueiros com um show cheio de guitarras e "toca Raul". O parque estava atípicamente movimentado, e haviam carros antigos de coleção estacionados nos caminhos de asfalto. Apesar das múltiplas muvucas, andamos um pouco até vermos uma muvuca mais heterogênea, concentrados numa clareira, carregando sacolas com mudas, plantinhas e plantonas.

Logo de cara, a primeira coisa que chamou a atenção foi o espaço que o Gerson Pinheiro montou para divulgar seu incrível trabalho no grupo SOS Resgate de Abelhas Sem Ferrão. O grupo é responsável por dezenas de resgates de enxames de abelhas nativas sem ferrão que estavam em áreas que ofereciam perigo para a espécie, como muros que seriam derrubados, árvores que seriam cortadas, telhados que seriam dedetizados. E assim, dão o devido acondicionamento aos enxames resgatados. Lá, havia em exposição lindos enxames de mandaçaia e a mirim. Quem teve curiosidade aprendeu como é feita a coleta, como é montada a nova casa para o enxame.


 Mais a frente, numa enorme mesa de concreto, o burburinho era justificado. Estavam dispostas mudas e sementes, a maior parte identificada, para quem quisesse levar. Simples assim, só aprender o que é, como cultiva e colocar na sacola. Havia guandús, cúrcumas, mongubas, batata-doce, muitos tipos de feijão, orelha de padre, bertalha, cará-moela, frutíferas de todos os tipos. Também dispunham-se adubos verdes, como a mucuna e a crotalária, cafés pequeninos, mini abacaxi, mini chuchu, e uma variedade de ornamentais. Só não aprendeu e trocou quem não quis!

 Na mesa do lado, rolou um pic nic muito animado com bolos, frutas e castanhas. Quem estava de fora e foi atraído pelo pic nic, logo se interessou pelas mudas e já saiu perguntando para que servia e como plantava aquele monte de coisas. Algumas invulgares, outras nem tanto, algumas identificadas, outras misteriosas, mas sempre deixando alguém feliz e o mais importante, ocupando um espaço público num âmbito de discussão de agricultura urbana e agroecologia.

Para quem conhece os Hortelões Urbanos, foi possível encontrar rostos apenas vistos no mundo virtual, nas fotos compactas dos avatares do Facebook. Ah, sim, o evento é organizado pela Daniela Cuevas, do Viveiro Arborizando, e a Juliana Gatti, do Árvores Vivas. Uma experiência muito interessante!

O mais legal é pensar que é uma evento de troca de mudas e sementes em pleno coração da maior metrópole da América Latina. É para se pensar na cadeia de produção, como a coisa é produzida e como chega a nossa mesa. É para discutir meio ambiente, resíduos e compostagem, ocupação de espaços públicos e biodiversidade. Para trocar sementes crioulas e não crioulas, experiências de quem já fez e de quem quer fazer. Definitivamente, não é pouca coisa.

Abelhas nativas
Vasos de plástico,  de PET, de improviso, de coração: leve o seu!

Frutíferas, muitas.

A divertida comilança.

A muvuca.

Aloés, bálsamos, medicinais.

Tinha até chuchu!

Mudas de todos os tamanhos



Identificados: fica bem melhor assim

Muita variedade, a maioria, de comer.

Todos os tipos de feijões

O próximo é na Primavera, no dia 21 de Setembro, domingo, as 11h. Local: Pq da Água Branca, na Av. Francisco Matarazzo, São Paulo. Prepare suas mudas, vá pensando em quais sementes levar, separe seu caderninho e mão a obra!

(Fotos cedidas por Felipe Borges)

sábado, 2 de agosto de 2014

Comendo no Inverno: Os pastos Apícolas

A primavera é conhecida como a estação das flores. Pudera, as chuvas voltam, o clima esquenta, as plantas aproveitam para dar flores, os insetos tem néctar, nascem os filhotes dos passarinhos que se alimentam dos insetos que se alimentam do néctar.... E aí segue uma cadeia infinita.

Ok, mas e no inverno? De que se alimentam os insetos no inverno? Porque, como eu e você, eles não hão de hibernar nem jejuar por tanto tempo. Mas, se na primavera tem flores, muitas, o que tem no inverno?

Flores, poucas. Mas flores. Por isso, é importante ter matinhos no quintal, diversidade de árvores na rua. Mesmo que não sejam nativas, melhor se forem. Mas mesmo que não, é bom ter uma fonte de comida para os insetos que se alimentam de néctar.

A história é a seguinte. Especialmente onde hoje são grandes cidades, a natureza dava seu jeito. No cerrado e matas aqui do sudeste, onde há estiagem e é frio, existem flores que abrem nessa época e fornecem alimento. Mas as cidades cresceram, as plantações de cana cresceram, os eucaliptais cresceram, e nada de flores no inverno.

As que estavam por aí, nas ruas, vasos, praças, canteiros e beiras de estrada, eu fotografei. Aposto que fizeram a festa das abelhas.

Maria pretinha, Solanum nigrum, que por sorte a prefeitura esqueceu de arrancar. Flores pros insetos, frutos pros pássaros.

Emília vermelha, Emilia forsbergii. Com abelha nativa.
Capuchinha na Horta da Lapa.

Crepe do Japão, Crepis japonica, posando pra foto.

Tagetes silvestre, dando cor pro terreno onde todo o resto do mato secou com a estiagem.

Grão de Bico, Cicer arietinum, delicada, na minha horta.

Nativa do cerrado, tida como daninha, a Vassoura-Relógio (Sida rhombifolia) estava se fechando ao anoitecer.

Dombéia, ou Astrapéia, Dombeya walichii. Africana, suas flores perfumadíssimas alimentam muitos tipos de abelhas. Cheia de nectar,  escuta-se o zum zum de longe.

Azaléia de jardim. Não dá mel muito bom, mas a Irapuã estava fazendo a festa.

Spermacoce verticillata, com abelha nativa.

Assa-peixe, Vernonia polysphaera, uma importante nativa que fornece muito néctar e pólen. Porte arbóreo.

Feijão Guandú, cheio de flor.

Pyrostegia venusta, Flor de São Joao, em fim de floração, também não faz feio em época de estiagem. Trepadeira sempre lotada de abelhas, abelhinhas e abelhões.

Alcaçuz do cerrado, Macroptilium lathyroides crescendo na roça. Lindas e enormes flores azuis. 

Planta venenosa, mais procurada por morcegos e mariposas, a Trombeteira, Brugmansia suaveolens, está linda, em especial a noite, quando fica perfumada. De dia, as Irapuãs se deleitam - e picotam tudo.


Alternathera paronychioides, com abelha nativa.



Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...