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domingo, 27 de março de 2016

Ançarinha Branca

Ançarinha-branca, jovem.
A ançarinha-branca era mais uma daquelas plantas que eu encontrava nos livros mas não encontrava na vida real. Dizem que está entre as plantas invasivas mais comuns, mas eu pessoalmente não a acho nada comum. A primeira vez que a vi foi com a Neide Rigo, que salvou uma mudinha nascida ao acaso na rua, mas acho que não foi pra frente. Tempos depois, a Lana, da horta do CCSP manda uma foto para identificar que matinho era aquele, e para minha surpresa, era a minha tão procurada ançarinha. Ganhei sementes e hoje tenho algumas mudas.

De fato, é uma planta facílima de cuidar que cresce sem nenhuma exigência, e assim como os bredos e carurus, prefere solos cultivados férteis e ensolarados. Em Botucatu vi centenas delas em um campo, invadindo plantações orgânicas - sorte que, por lá, eles entendem de matos comestíveis e ela entra inclusive nas cestas de CSA como hortaliça que é.

Folhas brancas e serrilhadas, já mais velha.

Brotos e inflorescência podem
ser comidas igual brócolis.


O sabor? Espinafre, idêntico. Saborosíssima. Deixa no chinelo plantas como a trapoeraba, que apesar da cor, tem gosto suave. Essa tem personalidade e é muito boa, daquelas que se eu dia eu encontrar na feira ficarei muito feliz.

É uma hortaliça de ciclo curto e crescimento rápido, ereta, chegando a mais de 1m de altura, com folhas pequenas, de formato serrilhados característico e coloração branca ou esbranquiçada. Na Europa é muito consumida como hortaliça, assim como usada na engorda de animais, por ser extremamente nutritiva, rica em ferro, vitamina E e proteínas. Os brotos tenros são maravilhosos e as flores jovens, minúsculas, podem ser consumidas tipo brócoli quando cozidas. Pode ser usada como hortaliça para tortas, recheios, massas, molhos e omeletes. Eu pessoalmente gosto das folhas refogadinhas com alho e acompanhando uma massa ou um pão integral.



Quando em flor, as folhas apicais afinam.
Uma única planta
fornece um bom maço de folhas.
Por ser da família dos amarantos e parente dos espinafres, recomenda-se seu consumo cozida. As sementes são muito parecidas com a quinua e o amaranto, o que pode ser notado pelo seu nome científico  Chenopodium album. O "album", aliás, sinaliza a linda cor clara de suas folhas.

Para semear, colha plantas maduras, espere secar e remova as sementes, que são pequenas, redondas e negras. Elas possuem dormência e podem demorar até 30 dias para germinar, então seu cultivo em escala é irregular e não permite colheita simultânea. As sementes que ficam no solo podem demorar muito tempo para germinar. 

Se conseguir sementes, saiba que você tem uma hortaliça deliciosa em mãos!

terça-feira, 22 de março de 2016

Ofinica PANC em São Paulo



Depois de muito tempo, voltamos com nossa agenda de oficinas e atividades. Faremos uma super-oficina sobre PANC na AAO, Associação de Agricultura Orgânica, em São Paulo.

Será um intensivo de 5 horas para aprendermos mais sobre o incrível mundo das PANC, com parte teórica e prática, abordando desde fundamentos de botânica e agroecologia até seu uso na gastronomia, com dicas de identificação, cultivo, coleta, plantio e preparo. Vamos também trocar mudas, sementes e dicas, pra todo mundo sair de lá preparado para começar sua produção!

Será das 9h as 14h, do lado do Metro Barra Funda, no dia 09/04, um sábado.

Vagas limitadas. 

Programa: Noções de biodiversidade alimentar. Evolução dos sistemas agrícolas e a revolução verde, porque comemos o que comemos? Flora nativa, nós consumimos? Noções de botânica. Benefícios ecológicos e cultivo orgânico e agroflorestal. Identificação prática. Usos na cozinha - inativação de enzimas, remoção de venenos. Principais formas de consumo para cada espécie. Benefícios e diferenciais nutricionais. Como coletar, cultivar, como multiplicar e onde adquirir. Ao final, troca de sementes e mudas de PANC incomuns.

Inclusos: Apostila PANC-AAO com dicas de cultivo, noções de botânica e listas de PANC Urbanas de São Paulo + troca de sementes e mudas + degustação de guloseimas feitas com ingredientes não convencionais.

Valores: R$90,00 para associados AAO e R$110, para não-associados.

Duração: 5h

Incrições e mais informações: (11)3875-2625 ou cursos@aao.org.br

Docente: Guilherme Reis Ranieri, gestor ambiental, mestrando em ciência ambiental e pesquisador em agricultura urbana pelo GEAU-USP. Autor da página Matos de Comer - www.matosdecomer.com.br

segunda-feira, 21 de março de 2016

Espinafre de okinawa, handama, 紅鳳菜

Maço misterioso nas ruas da Liberdade.
O espinafre de okinawa é uma verdura perene, de folhagem bicolor, porte arbustivo, que é cultivada na Ásia como hortaliça, sendo consumida tanto crua quanto cozida, possuindo sabor suave parecido com a salsa. 

Tenho por habito almoçar nos finais de semana  no Bairro da Liberdade, arrastando os amigos na desculpa de comer um bentô, quando na verdade o que eu quero de fato é namorar as vitrines das mercearias chinesas repletas de ingredientes, legumes e hortaliças não convencionais.

Misturado à outros vegetais pouco convencionais,
chama atenção pela coloração vívida.

Essa semana encontrei um maço de verdura, entre frutos de bucha, abóboras d'água e brotos de chuchu, diferente que tudo que já tinha visto. E acredite, sou rato de livros e artigos sobre biodiversidade alimentar e tenho um catalogo relativamente bom de plantas na minha cabeça. Mas aquela verdurinha roxa eu nunca tinha visto na vida, pessoalmente ou em livros, muito menos para vender nas mercearias.

A vendedora disse que sempre tem, mas eu desconfio que nunca cheguei cedo o suficiente para comprar ou de fato é produto novo. Não tem nome, preço, nada. Perguntando, uma vendedora que mal falava português me disse que se chamava "verdura roxa chinesa" e perguntei como comia, recebendo um "sim". Um senhor oriental muito idoso que estava por perto explicou que é uma verdura pra comer refogada, passada no óleo de gengibre (suponho que ele tenha a intenção de dizer gergelim). A esposa disse rindo que no final, coloca um tanto de sake ou pinga na panela e tampa pra pegar gosto. 

E começam as investigações sobre o que seria essa planta, porque eles disseram o nome em chinês e eu não fui capaz de entender. E como de chinês nada entendo, recorri as imagens até achar algo parecido com o que comprei. Espinafre de Okinawa, de nome científico Gynura bicolor, que, na verdade, não é espinafre. Cultivada em diversos países asiáticos, como China, Japão, Tailândia, Indonésia e acredite, até no Havaí. Apesar dos ramos, forma das folhas, não tem parentesco com o espinafre, mas sim com a serralha, a capiçoba e o dente-de-leão, assim como o alface e a escarola.



Pra quem já comeu capiçoba, ela é parecida, aromática, com um sabor agradável que lembra salsa. Folhas macias, suculentas, sem fibras e muito saborosas. Por ser uma planta cultivada, diferentemente de algumas PANC mais selvagens, possui folhas próprias pro consumo in natura por ter a combinação textura, sabor, fibrosidade e cor na medida certa. Refogada fica com gosto de espinafre, macia e quase escorregadia. Aliás, as receitas que consultei recomendam não picar para não ficar babento, e eu não achei nada babento. Pro suco verde ela pode entrar, mas sempre em quantidades pequenas, porque possui um teor alto de mucilagens e forma bastante espuma - talvez um suco verde espumante?

As folhas, uma mais bonita que a outra.

Cru ou refogadinho, é bem gostoso.
Cozinhei no arroz e de fato ele fica arroxeado, enquanto a cor desaparece na folha simplesmente refogada. Os pigmentos são antioxidantes, ela é rica em vitamina A, cálcio e proteínas, assim como possui substancias de interesse medicinal como sulforafano e genisteina.

É uma das verduras mais bonitas que já vi, e a planta, pelo que consultei, vira um lindo arbusto bicolor e muito ornamental. Multiplica-se com facilidade através de estacas, que devem ser desfolhadas e colocadas pra enraizar na água. Enraízam com facilidade, embora seja um processo que possa levar de uma a duas semanas. Algumas estacas eu espetei direto da terra e elas cresceram bem também, ou seja, a propagação é descomplicada. As minhas foram fortemente atacadas por pulgão quando começaram a  rebrotar, em parte porque não eram oriundas de cultivo orgânico e devem estar com hiperfertilização, deixando os tecidos moles e a planta desprotegida.

Tirei as folhas e coloquei na água.
Corte a base da haste e retire a parte ressecada.
Depois de 10 dias, cheia de raízes. 100% das mudas
estão enraizando.
Todas criando raízes.
As folhas crescem muito rápido.
 Para cultivar, ela adapta-se a todos os tipos de solo, preferindo sempre solos soltos, férteis e ricos em matéria orgânica, porque responde bem à fertilização, e gosta de regas regulares. Suas raízes são profundas, por isso gosta de vasos grandes e bem drenados. Conforme o manual de cultivo da Sociedade de Cultivo do Pacifico, é uma das plantas mais fáceis de se cultivar, pouco atacada por pragas, razoavelmente resistente às secas. Quem quiser mais informações, ficha completa dela aqui, em inglês.

Abaixo, fotos retiradas da internet, de sites chineses, mostrando o cultivo da planta em hortas e em escala comercial, pra você ter ideia da belezura dessa verdurinha. Note que, apesar de constar na bibliografia que ela pode chegar a meio metro de altura, ela é podada e mantida baixa, de forma que forma densos maciços e aproveita-se as folhas tenras e jovens.

Planta em cultivo. Foto daqui.

Planta em cultivo na China. Foto daqui. 
Foto em cultivo comercial na China. Foto daqui. 

segunda-feira, 14 de março de 2016

Pepininho-do-Mato, Pepinículo

Pepininho do mato no Parque do Ibirapuera.
O pepininho-do-mato é um grupo de mini-legumes, naturalmente pequenos, da família do pepino e da abóbora, muito saborosos, considerados legumes PANC. Causa uma reação muito interessante em quem o conhece pela primeira vez. Dei sorte de encontrar, nas muitas oficinas que dei, um pé de pepino-do-mato espontâneo. A maior parte das pessoas tem uma terna reação de "fofura", ahh, que lindinho! De fato, o mini pepino, pepino-do-mato ou pepinículo é um legume tão lindo e delicado que dá até dó de morder.

Existem, na verdade, ao menos quatro espécies de pepino-do-mato, cada um com sua peculiaridade. Em comum todos eles tem um ou dois centímetros de comprimento, crescem em plantas trepadeiras delicadas e pequenas, gostam de ambientes frescos e meia-sombra e não são exigentes quanto ao cultivo. Ah, sim, e todos tem um gosto profundo de pepino, que dá para consumir em uma só mordida. 

As folhas delicadas do Melothria pendula.
A espécie mais comum na região onde moro é o Melothria pendula, ou Melothria fluminensis. É uma planta espontânea, trepadeira, que atinge até 4 metros de comprimento e  agarra-se ao seu redor usando gavinhas, igual o maracujazeiro. O fruto tem por volta de 2,5 centímetros de comprimento e é tigrado nas cores creme e verde. Quando maduro fica com uma coloração marrom escura e textura molenga, e  há relatos de que seja um laxante forte se consumido nesse estágio. Portanto, prefira os jovens e crocantes. Extremamente adaptada ao ambiente urbano, nasce em cercas, jardins e muros.

Na Horta City Lapa, tocada pela amiga Neide Rigo.
Melothria pendula.

Na horta City Lapa. Reparei que as mudas
que tomam mais sol produzem mais cedo.
Há ainda o Melothria pendula, chamado de pepininho ou pepino-melancia, por ser rajado de verde claro e escuro. Esse pepino é mais vigoroso, possui as folhas maiores e ásperas, com frutos de até 6 centímetros de comprimento. Os frutos têm sabor e textura similares ao pepino comum, mas são interessantes para conservas, aperitivos e para enfeitar saladas. 

Temos também o Melothria scabra, de frutos de até 3 centímetros, rajado e arredondado, nativo do México de cultivo ainda pouco comum no Brasil, embora nasça por aqui.

São plantas muito abundantes na natureza, sendo facilmente encontradas em áreas abertas como pomares, lavouras, e jardins, onde é considerada daninha. Por sua rusticidade de cultivo, alta produção e valor ornamental, esses frutos são adequados para o auto-consumo; assim como podem ter alto valor agregado no comércio, sendo vendido na categoria de "mini legume", assim como ocorre com cebolas, abobrinhas, berinjelas e cenouras. É uma hortaliça para ser consumida do mato para a boca, porque é crocante e saborosa - basicamente, sementes encapsuladas dentro da uma casca fininha, pouca polpa,mas muito sabor.

Folha, fruto verde e maduro de Melothria fluminensis.

Segundo o Helton Josué, do Sítio Frutas Raras, para cultivá-lo é preciso colher as sementes do frutos maduros e molengos, de coloração escura. "A germinação ocorre em 12 a 25 dias em qualquer tipo de substrato rico em matéria orgânica, poroso, deixado em ambiente sombreado. Convém semear 2 ou 4 sementes diretamente nas covas ou canteiros previamente preparados embaixo da parreira. As mudas crescem rapidamente e a melhor época de plantio vai de agosto a outubro."

Aqui em São Paulo, fique de olho porque eles estão por toda parte. Já os vi no Horto Florestal, Parque da Luz, Ibirapuera, Aclimação, Jardim Botânico e estações de trem da CPTM, em cercas, muros, hortas, praças.  No Rio de Janeiro vi no Jardim Botânico e em algumas cercas. Lembro de ter visto em Curitiba nos diversos parques da cidade. Na casa dos meus pais em Itu, ele nasce por toda parte, sempre em locais mais sombreados. Esse ano nasceu enrolado na ora-pro-nobis!

terça-feira, 8 de março de 2016

Maracujá vermelho


A flor do maracujá vermelho, de rara beleza.
O maracujá vermelho é uma espécie de maracujá (Passiflora coccinea) nativa do Brasil e muito comum na região Norte, Nordeste e Centro Oeste, sendo cultivado como planta ornamental no sul e sudeste. Seu grande atrativo são as flores escarlate muito vistosas e seus frutos de coloração rajada, ácidos e delicados.

O meu maracujá vermelho adquiri pela primeira vez no CEAGESP, na feira de flores e mudas, com um produtor especializado em trepadeiras. Ele me garantiu que os frutos não eram comestíveis, eram apenas para os pássaros. Meu pé cresceu, floriu, frutificou, mas como ele orientou, fiquei receoso de provar os frutos.

Muito tempo depois, encontrei diversos deles em Cotijuba, saído de Belém do Pará, quando tive a oportunidade de experimentá-los. De fato, são muito ácidos, mas também aromáticos e saborosos, parecidos com o maracujá comum. Sua casca é fina e pode ser partido com as mãos, para ser degustado. 

Deve ser cultivado em cercas por ser uma trepadeira, de preferência protegido por árvores em regiões que sofrem geadas. Chega a muitos metros de comprimento, assim como maracujazeiro normal. Pode ser usado no lugar do maracujá e possui os mesmos usos: sucos, mousses, geleias, doces, bolos e polpas congeladas.

O fruto, rajado, com 6cm de diámetro e casca macia.

A polpa é amarelada, ácida e aromática.
Há poucos estudos a respeito de suas qualidades nutricionais, embora seja uma espécie descrita há muito tempo, pouco avaliou-se o seu potencial para a industria alimentícia. É uma planta muito vistosa e ornamental, que dá um toque diferenciado e tropical para qualquer projeto paisagístico. Se eu tivesse espaço, certamente teria uma muda dessa na cerca da minha casa. A floração é espetacular e muito vistosa, estendendo-se praticamente o ano todo. Atrai abelhas, pássaros e borboletas.

É possível multiplicar por estacas de caule, ou principalmente, por sementes. Gosta de solos férteis e irrigados. A minha muda, embora não esteja bonita, vai bem em Itu ,numa parte muito seca do terreno, o que mostra que ela é resistente. No inverno ele perde as folhas, mas volta a rebrotar e florir com o advento das chuvas, no entanto, continua uma planta compacta de poucos metros.

Foto daqui.

quinta-feira, 3 de março de 2016

Recuperação de área usando PANC (ou minha Micro-Agrofloresta)

Minha família tem uma casinha em Itu com um terreno muito pobre, árido e pedregulhento, onde nunca conseguimos colher muita coisa. Convivendo com permacultores e pessoas inspiradoras, resolvi colocar em práticas tudo que aprendi a respeito de cultivo consorciado pensando na formação de uma agrofloresta. Claro, privilegiei espécies não convencionais rústicas, de crescimento rápido e intenso, que me desse uma ajuda para melhorar o solo e recuperar a área.

Resolvi colocar a mão na massa em uma área pequenina, de uns 5 metros de largura por 8 de comprimento. Comecei afofando a terra, fazendo valas e removendo as pedras. Fiz algumas curvas de nível porque o local é íngreme, usando o método de fazer valas e cobrir tudo com muita matéria e troncos cortados. A terra era tão esturricada e erodida que não nascia nem mato, então não tive que cortar, salvo por uma ou outra braquiária agonizante. O local foi uma plantação de eucalipto e sofre capinas rotineiras pelos últimos 15 anos, e toda parte boa do solo se perdeu.  Apenas uma leucena estava no local e foi podada e usada como matéria orgânica. Bananeiras dispensadas pelo vizinho, serragem, folhas varridas e aparas de grama também foram usadas.

Priorizei a adubação verde com leguminosas como o feijão de porco, orelha de padre e feijão guandu, além de nabiço, milhete e sorgo. Usei também mucuna, margaridão e crotalária, não comestíveis, mas muito eficientes. Conforme elas cresciam, plantei tagetes e huacatay, que repelem nematóides do solo e atraem polinizadores. E as flores, zinnia, cosmea e chanana para ficar com cara de jardim, e não de mato. Plantei ainda plantas de porte baixo para cobrir a área rapidamente - a minha ideia é um plantio de baixo porte, aproveitando a graviola, o mate, a anona, o sabugueiro e o guanandi que já existem lá. Para cobrir o solo, grama amendoim, boldo rasteiro, batata doce, abacaxi, fisális e trapoeraba. Aqui e ali, o que sobreviveu: milho crioulo e mandioca. Coloquei aromáticas: alecrim, manjericão, alfazema, vetiver, boldo e cidreira.

Não sei se posso chamar de agrofloresta porque o manejo foi pouco, apenas desbastei os adubos verdes nas épocas certas, podei a leucena mensalmente para que não cobrisse tudo e controlei as trepadeiras. Seria mais um plantio misto e aleatório de espécies - tive que me ater às que sobreviveriam, não necessariamente as que eu queria. Se colhi muita coisa? O feijão de porco foi o mais abundante, a mucuna também. A mandioca deu uma colheita pouca, a batata doce estava pequena, mas as folhas foram bem aproveitadas. O mangalô seco ficou cheio de caruncho, mas as vagens verdes estavam ótimas, e o milho foi atacado por besouros, mas rendeu uma pipoquinha. Os pés de mamão secaram e morreram. O guandu rendeu quilos e quilos de ervilhas, e o cará-moela, muitas batatinhas. Das ervas, deu pra colher picão, guasca a alguns amarantos, além de muito huacatay. Mas não desisto. Semeei fedegoso e jurubeba, para espantar ainda mais os insetos indesejados. E continuo cuspindo sementes de frutas e legumes. As árvores nativas vão aparecendo, e vou deixando. Não sei nomear, não sei o que são, mas já são vitoriosas de escolherem um local tão precário pra crescer.

Se o que fiz é considerado produtivo? Não sei. Não gastei um centavo com mudas e sementes, todas colhidas, ganhas ou trocadas em pic nic de trocas. Não usei adubo nenhum, os microorganismos capturei na mata. Investimento zero. Não segui os protocolos dos grandes figurões da agroecologia, mas ao menos, deixei a terra respirar. 

Não daria para viver com as coisas dali, claro, porque a área é pequena e a energia que dediquei, pouca. Mas o trabalho foi apenas arrumar o solo, plantar, podar muito raramente e não regar nunca, ou seja, gastei poucas horas de trabalho e a natureza respondeu bem, além de não ter quase usado água. Com mais manejo, mais matéria orgânica, seleção boa de espécies, com menos negligência, acho que o resultado seria melhor. A "agrofloresta" sobreviveu a dois meses sem chuva, está num solo ácido e pedregulhoso altamente compacto. Está indo, linda. Fico feliz de saber que o solo melhorou, está mais fresco, úmido, e mais vivo com as aplicações mensais de microorganismos eficazes. 

Apesar dos apesares, é um exemplo de que sim, é possível fazer um cultivo praticamente do zero, com custo zero, usando apenas PANC e espécies comestíveis, livrar-se das braquiárias e dos capins, melhorar o solo e dar vida para onde é apenas pedra. Sei que o solo melhorou porque antes, mesmo as PANC mais resistentes não nasciam por aqui, e encontrei já picão, beldroega e guasca nascendo. A tanchagem ainda não encontrou espaço, e espero que os carurus venham também. Semeei tudo que encontrei pela frente, que vença o melhor. Quero aproveitar os estágios mais iniciais da sucessão para entender quais PANC gostam mais de cada ambiente. De qualquer forma, pensando que a agrofloresta tem pouco mais de um aninho de vida, muita coisa está por vir.


O terreno era assim. A agrofloresta fica localizada à
esquerda, numa área ociosa em frente às hortas.
Usei pneus, não uso mais. Foto em outubro de 2014,
já com a cobertura de matéria orgânica e poda.
Num segundo momento, vista de baixo,
já com cinco meses de idade. Feijões trepadeiros
predominam, nascem crotalárias, batata doce e guandu.

Agrofloresta com setes meses. Bertalha, mangalô e
cará moela subindo nos fios que coloquei.
Mais tempo depois, com nove meses.
Amaranto, mandioca, girassol, mucuna e mangalô.
Com 10 meses, já não há solo descoberto.
Um caos de trepadeiras e flores, em plena estiagem.
Agora, com 13 meses, o caminho quase fechou. As
aromáticas cresceram, assim como mudas nativas de
alecrim do campo e orelha-de-onça. Tive
um boom de tagetes e suprimi os feijões. As mandiocas,
margaridão e guandu passam dos dois metros.
Canteiro visto de baixo. Agroecologia ensinando sempre!
Muita vida, muita cor, muito cheiro.
As flores - para a mãe achar graça e o pai
não achar mato. Afinal, se é bonito, "não é mato".
O plantio inicial de coquetel de sementes em consórcio
com milho. Crotalária, mucuna, mangalô, guandu,
feijão de porco, tagetes, cosmos, zinnia, batata doce.
Tudo coberto com quase um palmo de folhas e galhos.
Que vença o melhor!

Lista de plantas comestíveis que usei para iniciar a cobertura (em consórcio com outras espécies, claro):

Plantas de Porte baixo para recobrir a área rapidamente
Batata Doce (vários tipos)
Trapoeraba Roxa
Boldo rasteiro

Adubos verdes, para fixar nitrogênio e fornecer biomassa
Amendoim
Gergelim
Nabo Forrageiro
Fedegoso
Feijão Orelha de Padre
Guandu
Leucena
Feijão Espada
Feijão Adzuki

Fontes de carbono e biomassa
Jurubeba
Milhete
Sorgo

Fontes de flores, biomassa e de ciclo curto
Tagetes
Huacatay
Fisális
Picão
Chanana
Caruru
Guasca
Serralha
Capiçoba
Amarantos
Tansagem
Espinafre africano (amaranto)

Plantas rústicas comestíveis diversas
Gravatá
Sabugueiro
Chaya
Inhame
Ananás
Cará Moela
Capim-santo
Cidreira de árvore

Não Comestíveis
Margaridão
Mucuna
Zinnia
Cosmea
Crotalária
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